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segunda-feira, 27 de maio de 2013

Malandros

Gilbert Garcin

Ricardo Salgado: “Portugueses preferem o subsídio de desemprego”
Ricardo Salgado, presidente do BES (…) continuou: "Se os portugueses não querem trabalhar e preferem estar no subsídio de desemprego, há imigrantes que trabalham, alegremente, na agricultura e esse é um factor positivo".


O que quer dizer Ricardo Salgado quando diz que os “portugueses preferem o subsídio de desemprego”?
Quer dizer que “os portugueses preferem o subsídio de desemprego”? Ou quer dizer que “os portugueses não devem preferir o subsídio de desemprego”?
 
A segunda afirmação, implícita nas palavras de Ricardo Salgado corresponde a um juízo de valor, é essa que vale a pena discutir. A primeira afirmação é um juízo de facto e, neste caso, corresponde a uma afirmação verdadeira: (alguns) portugueses preferem o subsídio de desemprego a trabalharem. Com é também uma afirmação verdadeira dizer-se que Ricardo Salgado em 2011 recebeu “801 mil euros, dos quais 546 mil euros devencimento fixo mais 2 mil euros de subsídios, acrescentando uma parte variável de 253 mil euros” ou que  “esqueceu-se de declarar 8,5 milhões de euros ao fisco” e retificou 3 vezes a declaração de IRS, a última fora de prazo. Tudo afirmações verdadeiras.
 
Se “os portugueses não devem preferir o subsídio de desemprego”, então, muito provavelmente, a melhor solução seria acabar com esse subsídio e, já agora, acabar também com o ordenado mínimo. Desta forma, surgirão no mercado de trabalho mais empregos e mais portugueses dispostos a preferir trabalhar. Ricardo Salgado já poderia contratar os seus colaboradores por 200 ou 300 € por mês.
 
“E continuou: "Se os portugueses não querem trabalhar e preferem estar no subsídio de desemprego, há imigrantes que trabalham, alegremente, na agricultura e esse é um fator positivo".” Claro que haverá sempre imigrantes que trabalham “alegremente” (aqui alguma reminiscência da “alegria no trabalho”?). Haverá até pessoas dispostas a trabalhar alegremente por um prato de comida. À la Martin, o jovem dos Prós e Contras, dir-se-ia até que trabalhar por um prato de comida é melhor do que morrer de fome (esta é a parte em que a assistência aplaude em júbilo).
 
E haverá sempre os malandros, aqueles que não querem trabalhar ou  que simplesmente se esquecem de pagar impostos. Mas será que os portugueses não querem trabalhar talvez porque mesmo trabalhando 12 horas por dia, seis dias por semana, ainda precisem de pedir ajuda para comer, como Natália?
 


Mas, ainda assim, o dono do banco tem razão: haverá sempre imigrantes a trabalharem alegremente por 287€ por mês, se vierem da Letónia. E haverá sempre quem ache isso muito, desde que essa miséria sustente o seu lucro ou simplesmente não lhe bata à porta.
Mas, para além de tudo, aquilo que é moralmente edificante é ver um banqueiro dizer às "Natálias" deste mundo como é que hão-de viver. É bonito.

 


1 comentário:

  1. Genial a aprecisção de "alegria no trabalho" ,comparado com " trabalhar alegremente".Um capitalista que quase invisivelmente defende um certo "totalitarismo" de quem trabalha "alegramente" . De certo que na sua secretária há uma qualquer imagem de um passado senhor a quem canta o Hino nacional diáriamente. Que nenhum deles "caia da cadeira".

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