Michael Hardt e Antonio Negri: Empire, Multitude e Commonwealth
Em Império (2001), Michael Hardt e Antonio Negri apresentam uma teoria
sobre a nova ordem mundial contemporânea. A essa nova forma de supremacia dão precisamente
o nome de “Império”. Segundo os autores, o
Império é a substância política que, de facto, regula as trocas globais e
governa o mundo globalizado, é a face jurídico-política da globalização
económica.
O conceito de “Império” caracteriza-se, primeiramente,
pela ausência de fronteiras; “o poder exercido pelo Império não tem limites. Antes e acima de tudo, portanto, o
conceito de Império postula um regime
que efetivamente abrange a totalidade do espaço, ou que de facto governa todo o
mundo “civilizado”. Nenhuma fronteira territorial confina o seu reinado.”
(Hardt e Negri, 2001, p. 14)
Consideram os autores que a transição para o Império surgiu “do crepúsculo
da soberania moderna (pois), em contraste com o imperialismo, o Império não
estabelece um centro territorial de poder, nem se baseia em fronteiras fixas. É
um aparelho de descentralização e desterritorialização do geral que
incorpora gradualmente o mundo inteiro dentro das suas fronteiras abertas e em
expansão.” (Hardt e Negri, 2001, p. 12)
Em segundo lugar, o
Império não se apresenta como conquista histórica, e sim como uma ordem que
suspende a História. “Do ponto de vista do Império, é assim que as coisas serão
hoje e sempre – e assim sempre deveriam ter sido” (Hardt e Negri, 2001, p. 14).
Além de estar fora do espaço, o Império situa-se também fora de qualquer
dimensão temporal, “exaure o tempo histórico, suspende a História, e convoca o
passado e o futuro para dentro da sua ordem ética. Por outras palavras, o
Império, apresenta a sua ordem como algo permanente, eterno e necessário.”
(Hardt e Negri, 2001, p. 29).
O terceiro aspeto dessa
nova ordem mundial relaciona-se com o facto de apesar das suas práticas
provocarem muita violência, “o conceito de Império é sempre dedicado à paz –
uma paz perpétua e universal fora da História.” (Hardt e Negri, 2001, p. 15)
Por colocar-se fora do tempo, o Império apresenta-se como promotor
da paz perpétua à luz da antiga Pax Romana. O Império é formado não com
base na força, mas com base na capacidade de mostrar a força como algo ao
serviço do direito e da paz, “a intervenção moral tornou-se a linha de frente
da intervenção imperial.” (Hardt e Negri, 2001, p. 55)
E assim instaura um poder policial para intervir em qualquer
região ao serviço da paz. “Dois elementos distintivos combinam-se neste
conceito da luta justa: primeiro, a legitimidade do aparelho militar desde que
eticamente fundamentado, e segundo, a eficácia da ação militar na conquista da
ordem e da paz desejadas.” (Hardt e Negri, 2001, p. 30)
Por último, o Império
atinge toda a vida social, desce às profundezas do mundo social. “Não só
administra o território com a sua população, mas também cria o próprio mundo em
que ela habita, regula as interações e rege a própria natureza humana. Tendo
como objeto de governo a totalidade da vida social, o Império apresenta-se como
uma forma paradigmática de biopoder” (Hardt e Negri, 2001, p. 15) num mundo
globalizado.
O biopoder configura uma forma de poder que regula a vida social
por dentro, acompanhando-a, interpretando-a, absorvendo-a e rearticulando-a. “Na sociedade disciplinar, portanto, a
relação entre o poder e o indivíduo permaneceu estável: a invasão disciplinar
de poder correspondeu à resistência do indivíduo. Em contraste com isso, quando
o poder se torna inteiramente biopolítico, todo o corpo social é abarcado pela
máquina do poder e desenvolvido nas suas virtualidades. Essa relação é aberta,
qualitativa e expressiva. (Hardt e Negri, 2001, p.
43)
O conceito de Império fornece o nível de
generalização adequado para se compreender o problema da dívida em toda a sua
real extensão. “Temos de aceitar o desafio e aprender a pensar e a agir
globalmente” (Hardt e Negri, 2001, p. 227), quanto mais não seja porque a dívida, ela própria, também está em toda a parte, é
cada vez mais uma relação universal que se apodera de toda a sociedade, que invadiu as formas de vida e que se alarga a todas
as suas etapas.
Como o Império, a dívida
não tem fronteiras. Estamos no terreno biopolítico. A dimensão do problema ocupou
a vida, dá-se em todo o tempo e em todos os lugares.
Hard Michael e Negri, Antonio (2001).
Império. Rio de Janeiro, São Paulo: Editora Record (3ª edição)