Não se trata dos milionários serem “imunes”
a tempos de crise. Pelo contrário: os milionários existem por causa dos tempos de “crise”. É preciso haver muito desemprego e
falta de rendimentos num lado para o bolo "aparecer” no outro lado.
Diz a notícia que o aumento de milionários
em Portugal resulta da poupança e do investimento (“as bolsas constituem uma boa
plataforma para aumentar rendimentos”). “O investimento é um risco, nestes
mercados, mas pode ser calculado e gerar bons lucros. Exceto para quem enfrenta desemprego, ou perda de rendimentos, que
não tem possibilidade de poupança e de investimento.”
Sabemos que já não existe a velha fábrica da revolução industrial nem o velho operário do mundo de Dickens. O sistema financeiro é hoje o grande dispositivo que
produz fortunas colossais a uma minoria, que controla a produção e o trabalho (a economia
real só consegue funcionar financeirizada), que aumenta as desigualdades e
que reproduz uma dívida infinita.
Tranquilamente, o sistema financeiro
fecha todo o circuito entre a moeda, a propriedade e o trabalho, como aqueles pássaros que,
no filme de Hitchcock, vão surgindo sem ninguém dar por eles ou saber de onde vêm. De repente,
são centenas, milhares, milhões…
Nesse mesmo filme, o mestre Hitchcock rejeita
explicitamente o uso de aves de rapina. É o recurso a pássaros “normais, de
todos os dias” que torna o filme especialmente aterrador.
Sem comentários:
Enviar um comentário