Elliott Erwitt, Metropolitan Museum
Papa confia nova tarefa aos guardas do Vaticano: combater a má-língua
“Não
à discórdia”, uma vil “tentação que agrada ao diabo, contra a unidade”,
diz o papa.
Onde é que eu já ouvi isto?
Onde é que eu já ouvi isto?
É
exatamente isto que oiço nos discursos dos nossos políticos quando apelam ao
"consenso", à “salvação nacional”, melhor dizendo, ao pensamento único. Também eles querem
esconjurar a “discórdia”, afastar a “tentação que agrada ao diabo”, entregar a mediação
das forcas sociais e políticas aos “guardas”, para “defenderem as portas e as janelas”.
A política é discórdia, é oposição, são "portas abertas". Os
espaços "consensuais", aparentemente destituídos dos seus conflitos e
desentendimentos inerentes, são lugares apolíticos, são espaços mortos. O “desentendimento”
é da ordem do político, o conflito e o dissenso caracterizam a própria vida pública.
Os sistemáticos apelos de todos estes "políticos",
portugueses e europeus para o “consenso” como a solução para o país, são a
própria negação do político, “o que o consenso pressupõe portanto é (...), em
suma, o desaparecimento da política” (Jacques Rancière (1996), O desentendimento. São Paulo: Editora
34, p. 105).
O dissenso, não
é simplesmente o conflito de interesses ou de valores entre grupos, caricaturalmente
apresentado como “intriga”, “calúnia” ou “má-língua”, mas, mais profundamente, é
o que possibilita a aparição de certos recortes do mundo que não são evidentes, que não são ditos, que têm
que ser construídos.
Quando aqueles que habitualmente não têm o direito à
palavra pela imposição do silenciamento (silêncio como interdição) se apropriam
desse direito, surge a "política" na sua expressão mais verdadeira de
acontecimento que perturba e reconfigura a distribuição “consensual” do direito
à fala.
E hoje é dia de “dizer”.
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