Construção da estátua em bronze do Marquês de Pombal,
destinada ao monumento da Rotunda em Lisboa, 1934.
"Aos seis anos já se aprende nas
escolas como ser um empresário de sucesso" (aqui)
Para
as gerações que nasceram depois da construção da ponte Vasco da Gama, é como se
a ponte sempre tivesse existido. Uma sensação parecida com aquela que todos nós
temos, por exemplo, relativamente à estátua do Marquês de Pombal na Rotunda.
Sempre a vimos, logo sempre existiu. Nunca pensamos que houve uma altura na
qual tudo aquilo que existe simplesmente não existia. Para a maior parte de nós,
as coisas existem e pronto, passam a ser naturais.
O
mesmo acontece com as pessoas que nasceram a partir da década de 70 do século XX,
para as quais o mundo sempre foi neoliberal. O neoliberalismo é a coisa mais natural do mundo. Mas
não é verdade. As pontes, as estátuas, o neoliberalismo são construções.
O que significa que existem mas podiam não existir.
A
própria economia de mercado não nasceu espontaneamente mas, pelo contrário, precisou
de estruturas de apoio (legislação, instituições, códigos, teorias,
conhecimentos…) sem as quais não seria possível a sua constituição.
Esta
ideia contrapõe-se ao pressuposto de que a organização social é o resultado natural de interações entre indivíduos,
que dão lugar ao desenvolvimento, também ele espontâneo, de estruturas sociais
ordenadas num processo evolutivo no qual o expoente final e mais evoluído seria
a própria economia de mercado. O que existiu foi um processo histórico de
construção social de instituições com um determinado conteúdo, por mais que o
credo liberal “ansiasse descobrir uma lei da sociedade tão universal como a lei
da gravitação da natureza” (Polany, 2012, p. 273).
O
homo economicus longe de ser o núcleo
fundamental e originário da natureza foi o resultado de uma violenta
institucionalização, que não só o integrou no mercado, mas também impôs que
permanecesse nele, através de um contínuo e sustentado esforço político de
disciplinamento e vigilância, para uma legitimação desse processo. As
diferentes formas de integração não só deram lugar à produção e consumo de
bens, como também à construção do próprio sujeito.
“Toda a subjetivação política é uma desidentificação, um arrancar à
naturalidade de um lugar.” (Rancière, 1996, p. 48) É a possibilidade de
desnaturalizar o enunciado “as coisas são como são”, que interrompe
e questiona toda a naturalidade de um lugar.
Hoje “aos seis anos já se aprende nas escolas como ser um empresário de sucesso”. Mas não, não foi sempre assim, por mais que nos convençam da bondade e da naturalidade desta espécie de mundo.
Referências
Polanyi, Karl (2012). A grande
transformação. Lisboa: Edições 70
Rancière, Jacques (1996). O desentendimento, política e
filosofia. São Paulo: Editora 34
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