Fotografia retirada daqui
Nesta tarde chuvosa de
domingo acabo de digitalizar fotografias de um velho álbum que há muitos anos guarda
pedaços de imagens a preto e branco.
Em estado de memória, revejo o álbum. As fotografias vão surgindo ao
meu olhar. Passo por algumas de forma breve, por outras detenho-me demoradamente
a observar todos os detalhes. De algumas não me lembro quase nada, outras parece
que foram tiradas ontem, como se contassem uma história de que ainda me recordo.
Em todas elas o tempo e
o espaço ficaram eternamente imobilizados, fizeram um “corte na matéria bruta da vida”, como
disse o fotógrafo Cartier Bresson.
Ao olhar para as fotografias, fico ali a imaginar, por vezes mais do que a lembrar-me, como seria o mundo
quando aquelas imagens eram matéria viva, antes do tempo se ter retirado. Aqueles
pedaços de imagens são um jogo de forças entre memória e esquecimento, uma tensão
dinâmica entre o que se vê e o que se sabe ter existido e aquilo que semi-existe, que permanece de forma
fragmentária ou simbólica.
Mas o velho álbum é um contador de histórias. Testemunha
momentos e acontecimentos que mantêm também presente a lembrança da família, daqueles
que fizeram parte da história. Lá estão os casamentos, aniversários, batizados,
férias na praia, almoços, festas ou o carro novo. “Eu estive ali”, “esta aqui
sou eu”, “esta era a minha casa”…
O álbum é um verdadeiro
arquivo de memórias e vestígios que contam histórias de família, que com o
passar de gerações e o amarelecer das suas folhas adquirem um estatuto de
objeto afetivo, um valor de relíquia, como certos objetos que ficaram da
infância, sabendo que uma parte dessas lembranças é uma memória mitificada. Definimos
e selecionamos aquilo que queremos conservar nas imagens fotográficas e, por
vezes, na própria memória das coisas.
O que têm a ver todas aquelas imagens antigas com a vida de hoje? Nada e
tudo.
Olho para elas como o cronista de Walter Benjamin “que não distingue entre
os grandes e os pequenos acontecimentos e que leva em conta a verdade de que
nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história”.
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