Nicolas Poussin, Os
pastores da Arcádia (1637-1638)
Numa paisagem tranquila, iluminada
pela luz quente da manhã, uma mulher e três pastores com os seus cajados e
coroas florais na cabeça estão diante de uma austera pedra tumular, que
encontraram isolada junto a umas árvores. No céu veem-se nuvens e no horizonte
perfila-se uma cadeia de montanhas. Toda a calma daquela paisagem reflete uma
relação do homem com a natureza em estado de harmonia.
Um dos pastores tenta decifrar
a inscrição contida na lápide, enquanto outro, que segura um cajado na mão
direita, olha para a mulher, apontando-lhe essa inscrição. O terceiro pastor, de
pé, com a mão esquerda sobre a pedra
tumular, permanece silencioso. A mulher, que pousa a mão direita no ombro de um
dos pastores, mostra-se expectante, com os olhos fixos naquele que decifra a
inscrição.
Na lápide pode ler-se “Et
in Arcadia ego”. A frase em latim diz-nos, numa
tradução livre: “eu estive na Arcádia”,
o nome de uma província da antiga Grécia.
O confronto com a irreversibilidade da nossa principal limitação, a
finitude da condição mortal do homem, aparece então diante dos nossos olhos
quando observamos aqueles “pastores da Arcádia” que descobriram o túmulo.
O sentido da frase na
lápide do túmulo é muito discutível. Talvez aí se perceba como os gregos e a sua
cultura influenciaram o pensamento artístico e filosófico de Poussin, o autor
do quadro, e dos seus contemporâneos. Talvez seja uma frase que muitos de nós gostaríamos
de ter no túmulo. Conhecer o berço das antigas civilizações, lugares de culturas,
onde o velho e o novo se misturam e onde encontramos as diferentes culturas dos
povos que guardam o tesouro que é o saber humano.
Mas exatamente hoje,
numa tradução ainda mais livre daquela frase naquele túmulo, quero pensar que todos nós estivemos na
Arcádia, enquanto a nossa própria origem e berço. Da minha Arcádia,
junto ao eterno Ulombe fará sempre parte a minha querida tia Deolinda, que agora partiu
mas que ficará na minha memória, como alguém que conheço desde a minha própria origem.
Até sempre.
Sem comentários:
Enviar um comentário