"Estava
eu numa aula de Economia e a professora ia-nos ajudando a fazer exercícios de preparação
para o exame que aí vem. Estávamos a resolver um exame, em conjunto, de um
qualquer ano que já passou e, enquanto eu pensava no que seria o meu almoço,
algo me chamou a atenção. Um dos exercícios da prova estava relacionado com as
despesas dos consumidores, estando estas divididas entre os vários tipos de
bens de consumo. E não é que as despesas ligadas à cultura estavam indicadas
como “supérfluas”?"
Mariana, 11º ano
Na “Carta a Meneceu”, Epicuro, um filósofo grego,
que começa
por dizer que “nunca é demasiado cedo nem demasiado tarde para cuidar do
bem-estar da alma”, apresenta uma classificação dos desejos ordenados
em três tipos diferentes: os que são naturais e necessários para a felicidade,
os que são naturais mas não são necessários e, finalmente, os que nem são
naturais nem necessários.
Talvez os primeiro sejam os mais fáceis de
exemplificar, como o desejo de comer e de beber, por exemplo. Os terceiros
também não oferecem muitas dúvidas, tais como desejar pintar as unhas de azul
ou comprar um casaco de peles de animais. Os segundos talvez sejam os mais complexos
e difíceis de definir, pelo menos até recorrermos a um enunciado do serviço
nacional de exame para efetuarmos uma escolha sobre o que devemos desejar para
sermos felizes.
A economia considera a cultura supérflua. O senso
comum, também. Não há aqui propriamente uma novidade, mas apenas a reafirmação de uma
racionalidade esclarecida que dispensa aquilo que não é apolineamente “necessário”.
A arte, o imaginário, o mito seriam modos de expressão
“supérfluos”, formas enganadoras para além de uma razão convencional que produz
declarações positivas e abstratas acerca das coisas. Como se a ordem não fosse
apenas concebível com a desordem, a luz com a escuridão, o som com o silêncio,
o prazer com a dor… ou simplesmente como se a desordem, a escuridão, o
silêncio, a dor não existissem, logo tudo o que lhes desse expressão seria supérfluo.
Muitos séculos depois de Epicuro, numa
gravura - lindíssima - de Goya pode ler-se que “o sono da razão produz monstros”. Mas uma
razão sempre desperta e vigilante, demasiado consciente de si mesma, produzirá também os
seus próprios monstros.
Afinal, que devemos desejar para sermos felizes? Experimente
a pegar numa caneta e numa folha de papel...
Talvez seja não seja tão difícil como parece.
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