“O recurso à
consultoria legal externa é usual no Estado. A explicação é a fragilidade dos
serviços, o risco é a promiscuidade.”
In Jornal "Público", 16 OUT 2012 (itálico meu)
"Outsourcing legislativo", dizem eles.
Orçamento de Estado: um documento político com recurso a Outsourcing legislativo em matéria fiscal.
Orçamento de Estado: um documento político com recurso a Outsourcing legislativo em matéria fiscal.
A dívida será um problema
de corrupção ou um problema que está na base da relação do capitalismo com o sistema político
representativo?
Aquilo a que
chamamos neoliberalismo, o conjunto de recomposições do capitalismo que desde
os anos 80 do século XX vem produzindo efeitos na sociedade global
contemporânea, tem forçosamente que se repercutir na relação do capitalismo com
o sistema político representativo.
No âmbito
dessa relação existe uma tendência para a substituição da lógica política da
representação (democracia) por uma lógica funcional, isto é, por uma mera
regulação técnica-executiva do poder político, que deixa de fora a esfera
representativa (os cidadãos). O próprio Estado passa a atuar segundo uma lógica
bastante próxima dos “mercados” (como qualquer empresa, recorre a Outsourcing, no caso em matéria de legislação fiscal) e, como tal, muito afastada das
fontes tradicionais de legitimação do Estado moderno.
Esta forma
de fazer política tem vindo também a justificar a retirada e a
“desresponsabilização” do Estado de algumas áreas, favorecendo parcerias e
privatizações, bem como favorecendo a transferência de rendimentos dos salários
para o pagamento das dívidas aos credores financeiros e o refinanciamento da
dívida privada através de apoios públicos.
Isto conduz
ao aprofundamento das desigualdades sociais e a forte investida contra os
direitos sociais da maioria dos cidadãos (trabalhadores, pensionistas,
desempregados, imigrantes, estudantes ou jovens em busca de emprego) como forma
de garantir as expectativas de rentabilidade de uma minoria no topo da
“pirâmide” (o capital financeiro e seus agentes).
Repito, não
sei até que ponto se trata de um problema de corrupção ou de todo um
dispositivo político de esvaziamento e paralisação da democracia, onde muitas
decisões não são aprovadas, nem sequer discutidas na Assembleia da República
(como a aplicação do “Memorando” da troika), mas impostas por
instituições europeias e internacionais e pelos próprios governos nacionais.
Ainda quanto
à dívida na zona euro: os tratados europeus (que também nunca foram discutidos
nem referendados), designadamente o Tratado de Lisboa, impõem aos
Estados a interdição de financiarem os seus défices através do Banco Central.
Isto quer dizer que, na prática, o Banco Central Europeu, ou os bancos centrais
de cada país, não podem comprar os títulos da dívida emitidos pelos Estados
para financiar o défice orçamental.
No caso da Europa, a soberania
política, em termos de decisões monetárias, foi completamente absorvida
pelo poder financeiro, na medida em que se cria e reforça a presença de um interveniente
no processo de financiamento dos Estados: os mercados financeiros,
constituídos por um conjunto de
bancos de investimento, companhias de seguros, fundos de pensões e fundos
especulativos (hedge funds) que compram e vendem ativos financeiros
(divisas, ações, obrigações dos Estados e produtos derivados).
Não estou a dizer, como é
evidente, que não existe clientelismo nem corrupção. Estou a
dizer que, pelo menos na caso da dívida, é um problema muito mais grave de captura da democracia.
Quando se decide romper o
cordão entre o Banco Central e o Tesouro Público, obriga-se o Estado a obter
financiamento junto dos mercados financeiros, o que provoca um aumento no
endividamento além da dependência aos mercados (habilmente chamada "independência"
(técnica) do BCE face ao poder
político).
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